Persigo a escrita como um fanático persegue o clube do coração. Desde os 12 anos, época em que minhas canelas atingiram o mais alto patamar em finura, levo isso a sério, até porque não existiu escolha.
E também foi com 12 que tive na sexta série um severíssimo professor de geografia. Alcunha do dito: Kléber. Altura, peso e fisionomia do dito: um metro e muitas outras medidas, uns setenta quilos e muitas outras gorduras, óculos-barba-nariz.
Os alunos, pelas costas (pela frente é que não seria), chamavam-no de Klebão. Não me lembro de ter visto alguém conversar em sala ou ir contra aquele professor; uma braveza que se impunha, expelia medo, fazia menino mijar pelas pernas e depois morrer de vergonha perante os coleguinhas de sala.
Em determinado dia, o Kléber deu pra gente um dever de casa para ser entregue na aula seguinte. O para casa era: criar uma narrativa que recontasse a chegada dos portugueses no território brasileiro.
Nunca fui de fazer para casa ou sempre fiz mal feito, mas as redações (as literárias) mexiam com a minha cachola. E estava ali uma oportunidade para apresentar aquilo que eu realmente tinha apreço e prazer em produzir: um texto narrativo.
Não me lembro como se deu a escrita do meu texto, se teve pesares, alegria (penso que sim), mas no dia seguinte ele se encontrava prontinho, em papel almaço, pronto para ser entregue ao ríspido professor.
A aula foi assim: todos os alunos em sala e o professor Kléber em riste próximo ao quadro negro. Sua voz grave ecoando para a turma: então, quem fez o dever de casa?
Como sempre fui um aluno "na minha" (pelo menos nessa segunda sexta série, já que a anterior eu tinha sido o capeta), continuei "na minha", esperando que algum aluno mais responsável, mais nota 10 — afinal eu fui um típico aluno nota 7, muitas vezes 6 —, levantasse a mão. Ninguém. Ninguém mais umas duas vez. Pra quê? Enchi meus pulmõezinhos medrosos de coragem e disse que tinha feito o tal dever de casa. Não deu outra: então leia.
Igualzinho um fusca custoso, fui lendo. Aparentemente tossindo, com certeza engasgando, fui lendo. Realmente me lembro um pouco do texto. Havia uma discussão entre o capitão e um de seus funcionários sobre a possibilidade de visualizarem terra alguns quilômetros à frente. Mal sabia que quem estaria embarcando e encontrando um lugar no mundo não eram os navegantes, mas eu mesminho.
Ao fim do engasgo, do suor frio, da leitura, o professor Kléber, no alto de sua voz grave e de sua testa franzida, largou de ser assim daquele jeito duro, deixando o cabelo da geral de pé quando não dispensou elogios sobre o texto. A real é que foi uma rasgação de seda. Uma seda que eu jamais tinha tocado. Uma cena para jamais esquecer, vinda do genioso professor Klebão. Com palavras novas para a minha cabeça: estrutura, narração, diálogo etc.
Daquela sexta série eu me lembraria do braço quebrado do Adam, das idas à biblioteca para pegar livros do Veríssimo e do Fonseca, dos amores platônicos, e claro, do professor Klebão, com aquele seu jeito, incentivando um escritor novato.
A partir dali fiquei à vontade para desenvolver outras narrativas que culminariam n'As Mais Velhas Histórias de Amanhã. Papo pra mais tarde.
E também foi com 12 que tive na sexta série um severíssimo professor de geografia. Alcunha do dito: Kléber. Altura, peso e fisionomia do dito: um metro e muitas outras medidas, uns setenta quilos e muitas outras gorduras, óculos-barba-nariz.
Os alunos, pelas costas (pela frente é que não seria), chamavam-no de Klebão. Não me lembro de ter visto alguém conversar em sala ou ir contra aquele professor; uma braveza que se impunha, expelia medo, fazia menino mijar pelas pernas e depois morrer de vergonha perante os coleguinhas de sala.
Em determinado dia, o Kléber deu pra gente um dever de casa para ser entregue na aula seguinte. O para casa era: criar uma narrativa que recontasse a chegada dos portugueses no território brasileiro.
Nunca fui de fazer para casa ou sempre fiz mal feito, mas as redações (as literárias) mexiam com a minha cachola. E estava ali uma oportunidade para apresentar aquilo que eu realmente tinha apreço e prazer em produzir: um texto narrativo.
Não me lembro como se deu a escrita do meu texto, se teve pesares, alegria (penso que sim), mas no dia seguinte ele se encontrava prontinho, em papel almaço, pronto para ser entregue ao ríspido professor.
A aula foi assim: todos os alunos em sala e o professor Kléber em riste próximo ao quadro negro. Sua voz grave ecoando para a turma: então, quem fez o dever de casa?
Escultura do filme "Darkness, Light, Darkness", de Jan Svankmajer. Tem a ver com o texto? Não, mas eu gosto. |
Igualzinho um fusca custoso, fui lendo. Aparentemente tossindo, com certeza engasgando, fui lendo. Realmente me lembro um pouco do texto. Havia uma discussão entre o capitão e um de seus funcionários sobre a possibilidade de visualizarem terra alguns quilômetros à frente. Mal sabia que quem estaria embarcando e encontrando um lugar no mundo não eram os navegantes, mas eu mesminho.
Ao fim do engasgo, do suor frio, da leitura, o professor Kléber, no alto de sua voz grave e de sua testa franzida, largou de ser assim daquele jeito duro, deixando o cabelo da geral de pé quando não dispensou elogios sobre o texto. A real é que foi uma rasgação de seda. Uma seda que eu jamais tinha tocado. Uma cena para jamais esquecer, vinda do genioso professor Klebão. Com palavras novas para a minha cabeça: estrutura, narração, diálogo etc.
Daquela sexta série eu me lembraria do braço quebrado do Adam, das idas à biblioteca para pegar livros do Veríssimo e do Fonseca, dos amores platônicos, e claro, do professor Klebão, com aquele seu jeito, incentivando um escritor novato.
A partir dali fiquei à vontade para desenvolver outras narrativas que culminariam n'As Mais Velhas Histórias de Amanhã. Papo pra mais tarde.