Estava eu assistindo a um programa pelo Youtube, um programa já extinto, chamado Musikaos, exibido pela TV Cultura em passado recente, apresentado por Gastão Moreira, jornalista cultural de quem eu tenho grande admiração.
Esse moço é o Júpiter. |
Gastão, nos dias atuais, toca um canal no Youtube chamado Kazagastão, o KZG. Foi em uma das playlists do canal — ou nos vídeos que o youtube relaciona, não lembro muito bem — que descobri um arquivo de vídeo do Musikaos em que Júpiter Maçã, ou na fase artística na qual foi gravado o vídeo, Jupiter Apple, apresentou-se com duas músicas e deu uma breve entrevista. E foi nas poucas palavras ditas pelo músico, e não nas cantadas, que me liguei, a ponto de pensar sobre aquilo a madrugada inteira, inclusive depois de acordar.
Quer dizer, algo que me colocou a escrever, sentar a bunda e escrever sobre. O lance foi simples, entre a primeira música e a última, pois só tocaram duas, Gastão partiu para a entrevista munido de pequenas perguntas (em sentido quantitativo) e obteve várias grandes respostas (em sentido qualitativo). Em uma delas, que foi mais ou menos assim — Júpiter, você toca vários instrumentos, domina o contrabaixo, gravou um disco inteiro sozinho, você teve professores ou sempre foi um autodidata?
Eu sempre soube de Júpiter como um autodidata, fiquei esperando a sua resposta, seria sucinta, "Sim, sou um autodidata", mas ele respondeu outra coisa, com aquele sotaque gringo e gaúcho — Não, tive professores. John Lennon, Harrison, Syd Barret.
A resposta arrancou sorriso meu e do entrevistador em planos temporais distintos. Para selar com cera vermelha, Gastão levantou:
A resposta arrancou sorriso meu e do entrevistador em planos temporais distintos. Para selar com cera vermelha, Gastão levantou:
— Você é um cara que teve muitas fases, cantou blues, folk, rock and roll, cantou em português, agora em inglês, você leva a sério essas diferentes fases, não é?
Júpiter arrematou:
— Se eu levo a sério as minhas fases? Sim, eu me respeito.
Júpiter arrematou:
— Se eu levo a sério as minhas fases? Sim, eu me respeito.
Discaço. |
E é este o ponto. Respeito próprio. Essa coisa do, Sim, eu me respeito, me fez refletir tanto sobre o respeito próprio, que... Putz. Algumas poucas e insistentes perguntas povoaram minha cabeça: quando você deixou de fazer algo que queria por algum motivo, por exemplo, por medo? Por julgar não ter tempo. Quantos poemas bons você deixou de criar ou letras de música porque não teve coragem de dizer o que pensava? Por que se preocupou com quem leria, com a cena musical da sua cidade? Quantos livros engavetados. Quantas vezes foi omisso a ponto de não dizer aquilo que pensa do mundo, dos parentes, dos amigos, da televisão, dos seus amores? Tudo por desrespeito próprio, eu aposto.
A arte do respeito próprio exige confiança. Desafio, portanto, dos mais difíceis. Não ceder. O simples gostar do que você gosta, relacionar-se com quem você gosta. Estar próximo e trabalhar para aquilo que você ama. Errar. Considerar suas motivações, seus pensamentos, seus desejos. Aqueles mais absurdos. Suas fases, a infância, a adolescência. A raiva, o ódio, o amor, a carência, o ciúme. A paranoia.
Escrevo isto daqui enquanto me vem toda a discografia do Júpiter. Uma obra de liberdade, de ambição. "Sim, eu me respeito". Gastão anuncia a banda pela última vez naquele dia, Júpiter toca a última música, então do trabalho posterior, o Hisscivilization, e deixa um cara em Belo Horizonte sem dormir.
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