Um bom poema me dá um tesão danado. Mas só o bom poema. Poema erótico? Não, qualquer bom poema. Aquele que você levaria para o deserto, pois só um bom poema é alimento no deserto. Uma vontade de escalar as paredes do quarto, lamber a torneira da pia, beijar estranho no corredor do supermercado, morder uma maçã como quem morde um seio, uma bunda, um dedo. O bom poema. Somente. Destilado em Drummond, Hilda Hilst, Dante, Cecília Meireles.
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Drummond curtindo a vida na praia de Ipanema |
O bom poema é um dedo no cu, uma massagem no grelo, um bom poema é Bomba de Antimoralidade, a cruz de cabeça pra baixo, a Igreja católica vomitando num banheiro químico. É Hiroshima dentro de nós. "Meu Deus, por que me abandonaste se sabias que eu não era Deus se sabias que eu era fraco". Um copo de água e gelo e "A ausência é um estar em mim. E sinto-a, branca, tão pegada, aconchegada nos meus braços".
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Hilda Hilst fumando um cigarrinho esperto |
E rodeia a sala com o copo molhado e fala: "Se eu disser que vi um pássaro Sobre o teu sexo, deverias crer?". E caminha procurando a porta, sinônimo de passagem, e "Existe a noite, e existe o breu. Noite é o velado coração de Deus". E se apega ao copo, ao formato do copo, joga o copo na parede. Não há mais portas, só percepção. "Deixai toda esperança, ó vós que entrais!", e depois suplica pelo copo perdido. Um bom poema dá um tesão danado e desidrata.