Nunca imaginei que eu, uma pessoa tão subjetiva, sem qualquer senso prático, pudesse se dar tão bem com o Excel. Há um ano, me enfiei dentro de uma repartição pública para organizar um arquivo composto por processos financeiros.
Meus dedos, tão acostumados a preencher laudas de ficção no Word,
tiveram de se familiarizar com planilhas complexas e recheadas de
contratos, editais e recursos humanos. Se aos 19 anos eu me apaixonei por Kafka, aos 30 eu o compreendo como nunca. O absurdo não tem seis patas e nem anda pelas paredes, nem é um
macaco que relata uma transformação pessoal para uma academia.
O absurdo é a própria academia a quem o relato é dado. Eu, um ser humano, com telencéfalo altamente desenvolvido e polegar
opositor, não me atinei sobre a minha própria metamorfose burocrática. Dia a dia remexo o absurdo em pastas suspensas além de tramitá-lo às repartições vizinhas. Será que os irmãos Campos conheciam a poesia concreta dessa argamassa administrativa? Tudo isso para dizer que não apenas me tornei prolixo e desnecessário como este texto, a academia e as repartições, como agora as planilhas preenchidas do Excel são os meus novos sonetos.
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